perder o braço no metro
perder a cabeça no carro
perder o sorriso
nos dentes
quem ganha tem mais pedaço
que corpo
Fernanda Tatagiba
sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014
quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014
Não é tanto aquilo que o poeta diz, mas o que vai implícito em seu dizer, sua dualidade intima e irredutível, que outorga as suas palavras um gosto de libertação. A frequente acusação que se faz aos poetas de serem aéreos, distraídos, ausentes, nunca totalmente deste mundo provém do caráter de seu dizer. A palavra poética jamais é totalmente desse mundo: sempre nos leva mais além, as outras terras, outros céus, outras verdades.
Octávio Paz- O Arco e a Lira
Octávio Paz- O Arco e a Lira
terça-feira, 25 de fevereiro de 2014
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor
Drummond
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor
Drummond
segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014
domingo, 23 de fevereiro de 2014
Mãos
Separadas
pelo corpo
côncavas
cordatos
ásperas do contato
excessivo
com o mundo
garram-se as coisas
soltas
agarram-se umas
às outras
Vagam
vazias
vasculhando
vastas superfícies
ou esquecidas
sobre sítios
tristes
Até que chegaram
as suas
Ana Martins Marques
pelo corpo
côncavas
cordatos
ásperas do contato
excessivo
com o mundo
garram-se as coisas
soltas
agarram-se umas
às outras
Vagam
vazias
vasculhando
vastas superfícies
ou esquecidas
sobre sítios
tristes
Até que chegaram
as suas
Ana Martins Marques
quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014
Eu já esqueci você, tento crer
Nesses lábios que meus lábios sugam de prazer
Sugo sempre, busco sempre a sonhar em vão
Cor vermelha, carne da sua boca,
Coração
Eu já esqueci você tento crer
Seu nome, sua cara, seu jeito, seu odor
Sua casa, sua cama, sua carne, seu suor
Eu pertenço à raça da pedra dura
Quando enfim juro que esqueci
Quem se lembra de você em mim, em mim
Não sou eu, sofro e sei
Não sou eu, finjo que não sei, não sou eu
Sonho bocas que murmuram
Tranço em pernas que procuram, enfim...
Não sou eu, sofro e sei
Quem se lembra de você em mim, eu sei, eu sei...
Bate é na memória da minha pele
Bate é no sangue que bombeia na minha veia
Bate é no champagne que borbulhava
na sua taça e que borbulha
agora na taça da minha cabeça
João Bosco e Waly Salomão
Nesses lábios que meus lábios sugam de prazer
Sugo sempre, busco sempre a sonhar em vão
Cor vermelha, carne da sua boca,
Coração
Eu já esqueci você tento crer
Seu nome, sua cara, seu jeito, seu odor
Sua casa, sua cama, sua carne, seu suor
Eu pertenço à raça da pedra dura
Quando enfim juro que esqueci
Quem se lembra de você em mim, em mim
Não sou eu, sofro e sei
Não sou eu, finjo que não sei, não sou eu
Sonho bocas que murmuram
Tranço em pernas que procuram, enfim...
Não sou eu, sofro e sei
Quem se lembra de você em mim, eu sei, eu sei...
Bate é na memória da minha pele
Bate é no sangue que bombeia na minha veia
Bate é no champagne que borbulhava
na sua taça e que borbulha
agora na taça da minha cabeça
João Bosco e Waly Salomão
quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014
Eu amo de um amor que jamais poderei expressar
Essas pequenas ruas com suas casas de porta e janela,
Ruas tão nuas
Que os lampiões fazem às vezes de álamos,
Com toda a vibratilidade dos álamos,
petrificada nos troncos imóveis de ferro,
Ruas que me parecem tão distantes
E tão perto
A um tempo
Que eu as olho numa triste saudade de quem
já tivesse morrido,
Ruas como as que a gente vê em certos quadros,
Em certos filmes:
Meu Deus, aquele reflexo, à noite, nas pedras
irregulares do calçamento
Ou a ensolarada miséria daquele muro a
perder o reboco...
Para que eu vos ame tanto
Assim,
Minhas ruazinhas de encanto e desencanto,
É que expressais alguma coisa minha...
Só para mim!
Mário Quintana
Essas pequenas ruas com suas casas de porta e janela,
Ruas tão nuas
Que os lampiões fazem às vezes de álamos,
Com toda a vibratilidade dos álamos,
petrificada nos troncos imóveis de ferro,
Ruas que me parecem tão distantes
E tão perto
A um tempo
Que eu as olho numa triste saudade de quem
já tivesse morrido,
Ruas como as que a gente vê em certos quadros,
Em certos filmes:
Meu Deus, aquele reflexo, à noite, nas pedras
irregulares do calçamento
Ou a ensolarada miséria daquele muro a
perder o reboco...
Para que eu vos ame tanto
Assim,
Minhas ruazinhas de encanto e desencanto,
É que expressais alguma coisa minha...
Só para mim!
Mário Quintana
- O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia. O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.
Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.
O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.
Alberto Caeiro
terça-feira, 18 de fevereiro de 2014
Colher
se o sol nela
batesse
em cheio
por exemplo
numa mesa posta
no jardim
imediatamente se formaria
um pequeno lago
de luz
Ana Martins Marques
batesse
em cheio
por exemplo
numa mesa posta
no jardim
imediatamente se formaria
um pequeno lago
de luz
Ana Martins Marques
Espelho
Dentro do armário
do seu quarto de dormir
deve haver um espelho.
Se você sai
e deixa o armário aberto
durante todo o dia
o espelho reflete
um pedaço da sua cama
desfeita.
Se você sai
e deixa a porta fechada
durante todo o dia
o espelho reflete o escuro
do seu armário de roupas,
a luz contida dos vidros
de perfume.
Do outro lado do poema
não há nada.
Ana Martins Marques
segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014
Escorre enquanto corremos. Talvez a imagem mais próxima que temos da chuva é quando estamos deitados na cama e vemos seu reflexo junto com um vento fino no poste da frente, ou na janela, plasmada de gotículas, uma fotografia que o sol guarda no outro dia.
Na exposição Lágrima de São Pedro do Vinícius S.A. ainda não vemos a chuva, mas podemos imaginar seu olho.
A obra que tem uma beleza visual estonteante, trazendo uma atmosfera própria e mágica. Dezenas de lâmpadas incandescentes cortadas, penduradas e cheias de água. Líquido onde era luz, natureza e homem, necessidade e invenção da necessidade.
Os pingos estão parados, nos é que movimentamos dentro dele. Num universo particular, os “habitantes” desse espaço aumentam e diminuem de tamanho mergulhando seu reflexo em cada lágrima de vidro, como se fossemos imensuráveis como a sede.
Estamos presos em cada gota, encobertos pela beleza, mas ainda sim, com a boca seca, separados um dos outros, esperando os deuses. São Pedro chora, lamenta ser esta a salvação e para de chorar quando as lágrimas não chegam.
O líquido encapsulado, a vontade de guardar envolvida em um manto fino, quebrável como o homem.
A exposição da uma sensação de tempo parado, como se flutuássemos com as gotas que não molham a terra. O andar na exposição é diferente, mais lento, por nosso medo de tocar nas lâmpadas, por ser absorvido por esse painel móvel e por não saber o que fazer com isso.
Afogaríamos em beleza e fantasia mas o incomodo de uma canção de lamento encharca os pés de terra. O som da criança acompanha a exposição como um mantra resignado e esperançoso. Lágrimas como chuva parada, repetição da resistente pobreza, da abundancia do líquido que não vem.
Afogaríamos em beleza e fantasia mas o incomodo de uma canção de lamento encharca os pés de terra. O som da criança acompanha a exposição como um mantra resignado e esperançoso. Lágrimas como chuva parada, repetição da resistente pobreza, da abundancia do líquido que não vem.
Afinal o que é estático?A água em cada gota-lágrima evapora no sertão do ar condicionado carioca.
Fernanda Tatagiba
o estalo do instante- parte 3- o sentido do beijo
A
roupa masculina é uma continuidade de retângulos pretos e brancos horizontais,
já a mulher tem uma quantidade de cores e formas maiores, inclusive com o desenho
de alguns círculos. Podemos interpretar essa dicotomia como sendo a
representação tradicional dos universos distintos do homem e da mulher. O homem como sendo
logico e racional, indicado pelas
figuras retas e preto e branco. Já a mulher, o
contrário. Seus círculos nos remetem a complexidade e variantes do universo
feminino, predominando a ideia de sensibilidade e extroversão. Sendo possível
identificar na abundancia de cores aleatórias, mas também em círculos que nos
lembra mandalas, que remete a noção de equilíbrio, e assim, traz a ideia que no
caos feminino estaria a harmonia.
O homem com as duas mãos segura o rosto da mulher
e seu corpo maior a envolve. Mesmo o beijo sendo no rosto, podemos perceber que
se trata de um amor romântico e não fraternal. A reciprocidade dela é indica
por suas duas mãos que envolve o corpo do homem, um no pescoço e a outra na mão
segurando a mão do homem que a beija, sugerindo que é ela quem comenda, mesmo que sutilmente a ação, o desejo.
O semblante da mulher é de entrega ao
momento e satisfação ao beijo recebido. Ela esta de joelhos, mostrando que
talvez em pé seria até maior que o homem, mas sua posição menor mostra a
relação de proteção, de amparo na visão da mulher que recebe o beijo.
Ela esta perto do "abismo" o chão se interrompe, deixando seus pés de fora, talvez sugerindo os riscos da ilusão, de uma visão fantasiosa do amor. A capa parece mágica e protege, por enquanto, que nada aconteça.
Este é um
quadro com uma visão feminina do beijo.
Fernanda Tatagiba
imagem: Klint
De alguma maneira, o nascimento da arte evidencia para Batalille o nascimento do homem, mas a arte não afirma apenas o homem na sua diferença do animal, ou seja, através da afirmação de tudo o que é humano nele, mas ao contrário, comemora a sua capacidade de se afirmar, abandonando por um momento tudo aquilo que o fez homem, e glorificar-se não na aquisição dessa humanidade, mas na abolição dela. Assim, a arte testemunha uma dupla transgressão; primeiro, o homem transgredindo sua condição natural e, segundo. o homem transgredindo sua própria humanidade diante da morte própria.
Karl Erik Schollhammer- Além do Visível- O Olhar da Literatura
domingo, 16 de fevereiro de 2014
Balanço
As redes não são para deitar, dormir, sentar, ficar quieto. É algo entre uma coisa e outra, um balanço. As redes são moveis, mas grudadas na parede, ou qualquer lugar fixo, podendo ser levada a qualquer momento para outro canto. Dobráveis não domam o formato do corpo, faz do pano a nossa forma.
A cama, presa e segura do sono, vai afundando. Esticada parece esta sempre nos fazendo levantar. O que na cama é insonia na rede é deleite. A cama esta atravessada no canto da casa, um túmulo aberto. A rede pode esta em qualquer lugar, dentro e fora de casa, no caminho, atrapalha nossa pressa. A rede é o lugar da conversa, na cama é quando ela se encerra, ou se transforma em um adendo.
A rede já nasce em direção ao chão, com suas pontas para cima como um sorriso. Uma rede deita e outra pesca, um objeto com o dom do amparo, pronto para receber. As redes nunca são iguais. Seu enfeites, rendas e bordados é como o sono que precisa mais que olhos fechados. A rede nos lembra que não basta dormir, é preciso garantir o sonho.
Texto de Fernanda Tatagiba a partir da exposição No Balanço da Rede aberto para visitação na Caixa Cultural no Rio de Janeiro de 14 de janeiro a 23 de fevereiro de 2014
Enxerga pouco, os óculos são fundos, da grossura de um dedo, se os dedos pudessem ser medidos com óculos. Deve precisar eles para me ver, para pegar o ônibus e o telefone para marcar o encontro. Mas quando nos beijamos fecha os olhos como se não tivesse óculos, como todo mundo. Será que ela me acha mais bonita com ou sem óculos? Não penso em nada enquanto nos beijamos.
Quando se tira os óculos só vemos a imaginação, os melhores tropeçam. Eu acho a vida mais bonita com detalhes, mas ver as pequenas coisas deve ser uma escolha, então não seriam pequenas. Colocar os óculos é decidir por elas.Também sou míope, só que bem menos. Gosto dessas duas maneiras de ver o mundo.
Quando se tira os óculos só vemos a imaginação, os melhores tropeçam. Eu acho a vida mais bonita com detalhes, mas ver as pequenas coisas deve ser uma escolha, então não seriam pequenas. Colocar os óculos é decidir por elas.Também sou míope, só que bem menos. Gosto dessas duas maneiras de ver o mundo.
Na cama, quando os namorados ficam perto e conversam as coisas mais importantes da vida, ela as vezes tira os óculos e fica grudadinha nos meus olhos, encontrando um ponto máximo do não contato. Mais um pouco e atravessaríamos a cegueira da outra. Ela parece gostar de ficar assim desafiando a olha-la, como se me perguntando se estou vendo e quando mais perto menos nítida fica.
É esse o ponto do encontro. Os olhos se parecem, nublados com a mesma imprecisão uma da outra. Tentando buscar a medida única de ver o mundo da mesma forma. Com os olhos fechados nos beijamos, para ter certeza.
Fernanda Tatagiba
Fernanda Tatagiba
sábado, 15 de fevereiro de 2014
O que será
O que será, que será?
Que andam suspirando pelas alcovas
Que andam sussurrando em versos e trovas
Que andam combinando no breu das tocas
Que anda nas cabeças anda nas bocas
Que andam acendendo velas nos becos
Que estão falando alto pelos botecos
E gritam nos mercados que com certeza
Está na natureza
Será, que será?
O que não tem certeza nem nunca terá
O que não tem conserto nem nunca terá
O que não tem tamanho...
Que andam suspirando pelas alcovas
Que andam sussurrando em versos e trovas
Que andam combinando no breu das tocas
Que anda nas cabeças anda nas bocas
Que andam acendendo velas nos becos
Que estão falando alto pelos botecos
E gritam nos mercados que com certeza
Está na natureza
Será, que será?
O que não tem certeza nem nunca terá
O que não tem conserto nem nunca terá
O que não tem tamanho...
O que será, que será?
Que vive nas idéias desses amantes
Que cantam os poetas mais delirantes
Que juram os profetas embriagados
Que está na romaria dos mutilados
Que está na fantasia dos infelizes
Que está no dia a dia das meretrizes
No plano dos bandidos dos desvalidos
Em todos os sentidos...
Que vive nas idéias desses amantes
Que cantam os poetas mais delirantes
Que juram os profetas embriagados
Que está na romaria dos mutilados
Que está na fantasia dos infelizes
Que está no dia a dia das meretrizes
No plano dos bandidos dos desvalidos
Em todos os sentidos...
Será, que será?
O que não tem decência nem nunca terá
O que não tem censura nem nunca terá
O que não faz sentido...
O que não tem decência nem nunca terá
O que não tem censura nem nunca terá
O que não faz sentido...
O que será, que será?
Que todos os avisos não vão evitar
Por que todos os risos vão desafiar
Por que todos os sinos irão repicar
Por que todos os hinos irão consagrar
E todos os meninos vão desembestar
E todos os destinos irão se encontrar
E mesmo o Padre Eterno que nunca foi lá
Olhando aquele inferno vai abençoar
O que não tem governo nem nunca terá
O que não tem vergonha nem nunca terá
O que não tem juízo...(2x)
Que todos os avisos não vão evitar
Por que todos os risos vão desafiar
Por que todos os sinos irão repicar
Por que todos os hinos irão consagrar
E todos os meninos vão desembestar
E todos os destinos irão se encontrar
E mesmo o Padre Eterno que nunca foi lá
Olhando aquele inferno vai abençoar
O que não tem governo nem nunca terá
O que não tem vergonha nem nunca terá
O que não tem juízo...(2x)
Chico Buarque
quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014
(...) buscamos a nós mesmo na alteridade, nela nos encontramos e, depois de nos confundirmos com esse outro que inventamos e que não passa de um reflexo nosso, rapidamente nos separamos desse fantasma, deixando-o para trás, e corremos de novo em busca de nós mesmos, atrás de nossa sombra. Um contínuo ir em frente, sempre em frente- não sabemos aonde. E a isso chamamos: progresso.
Octavio Paz - Filhos do Barro
Octavio Paz - Filhos do Barro
quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014
A única maneira de ser inteligente é quando seu coração é colocado lá. Então como é que você faz para provocar um aluno a querer apreender? O professor tem que provocar o vazio no garoto de sete anos, para que esse garoto queira preencher esse vazio com pesquisa. O que é o vazio senão o afeto? O aluno vai querer aprender o que tem a ver com afeto. Você só aprende o que você já sabe, essa é a única realidade. A gente só busca o que já está na gente. O afeto é a razão de ser da vida. Então temos que juntar afeto e conceito num modo só.
Viviane Mosé em entrevista ao Onitorrinco (link)
Viviane Mosé em entrevista ao Onitorrinco (link)
segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014
O quê
Que não é o que não pode ser que
Não é o que não pode
Ser que não é
O que não pode ser que não
É o que não
Pode ser
Que não
É
O que não pode ser que
Não é o que não pode ser
Que não é o que
O que?
O que?
O que?
Que não é o que não pode ser que não é
Arnaldo Antunes
Não é o que não pode
Ser que não é
O que não pode ser que não
É o que não
Pode ser
Que não
É
O que não pode ser que
Não é o que não pode ser
Que não é o que
O que?
O que?
O que?
Que não é o que não pode ser que não é
Arnaldo Antunes
domingo, 9 de fevereiro de 2014
Ao contrário
A porta bate
barulho de chave
-Antes, porém, cabides-
-Antes, porém, vasos -
Agora a porta bate
e a chave tranca,
o armário nu
aplaude, com duas portas
resta a camisa manchada
que você não usa mais
deixou aqui em casa
tudo que não te faz falta
deixou aqui em casa
tudo que não te apraz
Restam, além, as minhas roupas
apenas, solitas
à sós: eu e elas
manchadas do teu cheiro
e o cheiro corta, e o cheiro volta
se eu fechar os olhos
A porta bate
ouço você "bom dia"
a alguém aqui na frente
"bom dia", o último, doravante
"bom dia", pra quem?
num tapa
a porta bate
---------------
A porta bate
barulho de chave
-depois, porém, camisas-
-depois, porém, flores-
Agora a porta bate
e a chave abre
as roupas de volta, os armários
arreganham, as duas portas
junto às camisas manchadas
as que você usa mais
trouxe aqui pra casa
tudo que me faz falta
trouxe aqui pra casa
tudo que me apraz
Restam, além, as mágoas
apenas, contidas
juntos: eu, você
encharcados do teu cheiro
que conforta, que me envolve
qu'eu agora sinto.
A porta bate
ouço você "saudade"
e é tudo diferente
"saudade", não mais, doravante
"saudade", d'alguém
num ato
a porta bate
ao contrário.
Izabela Bravin
barulho de chave
-Antes, porém, cabides-
-Antes, porém, vasos -
Agora a porta bate
e a chave tranca,
o armário nu
aplaude, com duas portas
resta a camisa manchada
que você não usa mais
deixou aqui em casa
tudo que não te faz falta
deixou aqui em casa
tudo que não te apraz
Restam, além, as minhas roupas
apenas, solitas
à sós: eu e elas
manchadas do teu cheiro
e o cheiro corta, e o cheiro volta
se eu fechar os olhos
A porta bate
ouço você "bom dia"
a alguém aqui na frente
"bom dia", o último, doravante
"bom dia", pra quem?
num tapa
a porta bate
---------------
A porta bate
barulho de chave
-depois, porém, camisas-
-depois, porém, flores-
Agora a porta bate
e a chave abre
as roupas de volta, os armários
arreganham, as duas portas
junto às camisas manchadas
as que você usa mais
trouxe aqui pra casa
tudo que me faz falta
trouxe aqui pra casa
tudo que me apraz
Restam, além, as mágoas
apenas, contidas
juntos: eu, você
encharcados do teu cheiro
que conforta, que me envolve
qu'eu agora sinto.
A porta bate
ouço você "saudade"
e é tudo diferente
"saudade", não mais, doravante
"saudade", d'alguém
num ato
a porta bate
ao contrário.
Izabela Bravin
sábado, 8 de fevereiro de 2014
A Vida Bate
Não se trata do poema e sim do homem
e sua vida
- a mentida, a ferida, a consentida
vida já ganha e já perdida e ganha
outra vez.
Não se trata do poema e sim da fome
de vida,
o sôfrego pulsar entre constelações
e embrulhos, entre engulhos.
Alguns viajam, vão
a Nova York, a Santiago
do Chile. Outros ficam
mesmo na Rua da Alfândega, detrás
de balcões e de guichês.
Todos te buscam, facho
de vida, escuro e claro,
que é mais que a água na grama
que o banho no mar, que o beijo
na boca, mais
que a paixão na cama.
Todos te buscam e só alguns te acham. Alguns
te acham e te perdem.
Outros te acham e não te reconhecem
e há os que se perdem por te achar,
ó desatino
ó verdade, ó fome
de vida!
e sua vida
- a mentida, a ferida, a consentida
vida já ganha e já perdida e ganha
outra vez.
Não se trata do poema e sim da fome
de vida,
o sôfrego pulsar entre constelações
e embrulhos, entre engulhos.
Alguns viajam, vão
a Nova York, a Santiago
do Chile. Outros ficam
mesmo na Rua da Alfândega, detrás
de balcões e de guichês.
Todos te buscam, facho
de vida, escuro e claro,
que é mais que a água na grama
que o banho no mar, que o beijo
na boca, mais
que a paixão na cama.
Todos te buscam e só alguns te acham. Alguns
te acham e te perdem.
Outros te acham e não te reconhecem
e há os que se perdem por te achar,
ó desatino
ó verdade, ó fome
de vida!
O amor é difícil
mas pode luzir em qualquer ponto da cidade.
E estamos na cidade
sob as nuvens e entre as águas azuis.
A cidade. Vista do alto
ela é fabril e imaginária, se entrega inteira
como se estivesse pronta.
Vista do alto,
com seus bairros e ruas e avenidas, a cidade
é o refúgio do homem, pertence a todos e a ninguém.
Mas vista
de perto,
revela o seu túrbido presente, sua
carnadura de pânico: as
pessoas que vão e vêm
que entram e saem, que passam
sem rir, sem falar, entre apitos e gases. Ah, o escuro
sangue urbano
movido a juros.
São pessoas que passam sem falar
e estão cheias de vozes
e ruínas . És Antônio?
És Francisco? És Mariana?
Onde escondeste o verde
clarão dos dias? Onde
escondeste a vida
que em teu olhar se apaga mal se acende?
E passamos
carregados de flores sufocadas.
Mas, dentro, no coração,
eu sei,
a vida bate. Subterraneamente,
a vida bate.
mas pode luzir em qualquer ponto da cidade.
E estamos na cidade
sob as nuvens e entre as águas azuis.
A cidade. Vista do alto
ela é fabril e imaginária, se entrega inteira
como se estivesse pronta.
Vista do alto,
com seus bairros e ruas e avenidas, a cidade
é o refúgio do homem, pertence a todos e a ninguém.
Mas vista
de perto,
revela o seu túrbido presente, sua
carnadura de pânico: as
pessoas que vão e vêm
que entram e saem, que passam
sem rir, sem falar, entre apitos e gases. Ah, o escuro
sangue urbano
movido a juros.
São pessoas que passam sem falar
e estão cheias de vozes
e ruínas . És Antônio?
És Francisco? És Mariana?
Onde escondeste o verde
clarão dos dias? Onde
escondeste a vida
que em teu olhar se apaga mal se acende?
E passamos
carregados de flores sufocadas.
Mas, dentro, no coração,
eu sei,
a vida bate. Subterraneamente,
a vida bate.
Em Caracas, no Harlem, em Nova Delhi,
sob as penas da lei,
em teu pulso,
a vida bate.
E é essa clandestina esperança
misturada ao sal do mar
que me sustenta
esta tarde
debruçado à janela de meu quarto em Ipanema
na América Latina.
sob as penas da lei,
em teu pulso,
a vida bate.
E é essa clandestina esperança
misturada ao sal do mar
que me sustenta
esta tarde
debruçado à janela de meu quarto em Ipanema
na América Latina.
Ferreira Gullar
sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014
quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014
domingo, 2 de fevereiro de 2014
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